Quando uma empresa age com humanidade e razão

Pessoa jurídica é um termo interessante. Ele designa uma empresa, mas ainda mantém o conceito de pessoa e traz consigo um balaio de ideias que temos sobre como as criaturas humanas devem ser. As boas, pelo menos.

Hoje, com o empoderamento (um dia eu tinha que usar essa tradução feia pra ‘empowerment’) que as pessoas conquistaram nas redes sociais, vemos muitas empresas totalmente perdidas, que não sabem como se relacionar com gente. Muitas são extremamente arrogantes, acham que são donas da verdade. que sempre têm razão e ainda destratam o consumidor. Claro, muitas vezes o consumidor é agressivo também, age de forma pernóstica. Mas se o consumidor foi lesado, a empresa ou o atendente tem que saber lidar. Afinal de contas, a pessoa que sofreu uma perda certamente estará num estado alterado.

Aconteceu comigo ontem um problema com uma empresa, que me deixou bem chateada. Mas ela agiu de forma tão bacana que valeu como um bom exemplo. Foi assim:

“Eu estava em Berlim e queria comprar um presente pro meu chefe, o Guerreiro. Numa loja perto do lugar onde ficava a conferência Re:publica, achei um mimo muito bacana, simples, bonitinho e tecnológico: um gravador de recados em vídeo, pra deixar na geladeira.

Sim, claro, você pode gravar recados no seu celular, mas você não vai deixar seu iPhone colado na geladeira vai? Nem vai entregar o aparelho com o recado para sua secretária. O VideoMemo pareceu ótimo.

O formato do aparelhinho parece com o balão azul do logo do R7. Mas a amostra, o aparelho que estava aberto na loja, era muito fofo e vermelhinho. Tinha cara de geladeira de cozinha. Assim, olhei as cores nas caixinhas empilhadas para compra e peguei uma caixa de um aparelho vermelho. Paguei, levei.

Ontem, ao chegar no R7, entreguei o presente para o Guerreiro com um bilhetinho. Quando o telefone tocou e ele me chamou pra pedir uma ajuda porque ele não estava entendendo o presente, gelei. Guerreiro é uma das pessoas mais inteligentes que já conheci. (E, evidentemente, as pessoa chatas, quer julgam mal e que não gostam de mim vão dizer que é puxa-saquismo. Errado. Primeiro que sou muito orgulhosa e metida pra ser puxa-saco. Nunca fui, nunca serei. Minha arrogância não deixa.) Se ele não estava ‘entendendo’ alguma coisa não estava certa. E não estava. A caixinha, que eu não tinha aberto, não continha o aparelho. Estava vazia, só com a parte das instruções e do íma. Fiquei arrasada.

Pedi mil desculpas para ele, que foi gentil e disse que não tinha problema e fui para minha mesa literalmente acabada.

A primeira coisa que fiz foi achar a loja. Entrei no Google, peguei o endereço do evento Re:publica, localizei no Google Maps e procurei o nome da loja no Google Street View. Alguma coisa não deu muito certo no primeiro momento, mas logo achei o lugar. Fui no site da loja, procurei os contatos e encontrei três emails.

Escrevi para os três endereços com fotos da caixa vazia, aberta e fechada.

Um dos emails estava em reply automático. O segundo não respondeu. Mas o terceiro chegou esta manhã.

A primeira frase dizia assim: “pedimos desculpas por esta situação imperdoável, um erro primário da nossa equipe”. Em seguida ele disse que eu estava certa. Que o produto em amostra na loja é o vermelho, o único desta cor. E que a caixa vazia não deveria estar na pilha dos produtos para serem comprados. Por último ele perguntou qual era a melhor forma pra mim para resolver a situação, se eu queria o dinheiro de volta na minha conta bancária ou outra solução.

Veja os passos da empresa para com o consumidor que está se queixando de um problema, num email t’ao simples e pequeno:

.Ela se coloca ao lado do consumidor que está sofrendo e diz que lamenta o que aconteceu e que não há desculpa para o ocorrido
.Ela assume que foi um erro básico da equipe e diz que o consumidor está certo em seu raciocínio: a caixa vazia do produto em amostra foi colocada por engano na pilha dos produtos à venda.
.Ela coloca alternativas e pergunta qual a melhor forma para lidar com a situação agora que ela aconteceu, sob o ponto de vista do consumidor lesado.

Infelizmente nem sempre as empresas agem assim. Muitas vezes elas são arrogantes e prepotentes e antes mesmo de OUVIR o cliente ou sequer pensar em admitir o erro óbvio, elas tentam BOTAR A CULPA no consumidor! Coisas como:

– Você deveria ter aberto a caixa antes de levá-la (Deveria? Por que? A loja vende caixa vazias como regra? Ou como um engano fortuito? E, se vende, o vendedor não deveria verificar isso pra mim?

– Você não sentiu o peso da caixinha quando pegou na mão? (Não. A caixinha tem um bom peso, porque tem um íma e livreto de instruções. E, se vale pra mim, uma turista que pegou a caixa na mão pela primeira vez, vale para o vendedor também, que já conhece o produto)

E o pior de todos:

– Nossa! Você deu azar, hein? Com uma pilha de caixas você foi pegar JUSTAMENTE a que estava vazia, a caixa da amostra da loja!

Realmente, é de matar. Tem muita gente, pessoas físicas e jurídicas, que por princípio tentam culpar a pessoa lesada, nem que seja por questões subjetivas e metafísicas.

Olhar para o processo e admitir um erro é sinal de maturidade empresarial. Ou pessoal. A loja quer vender produtos. Bons produtos, que deixem o cliente satisfeito. Assiim ele compra mais e recomenda pros outros. A loja não quer vender caixas vazias, que atravessam oceanos e chegam como presentes invisíveis. As lojas devem ter um produto como amostra. Mas ao tirar o produto da caixa você não coloca a caixa na pilha de produtos para serem vendidos, porque isso induz ao erro. Alguém vai pegá-la em um momento ou outro.

Para terminar a história, propus o seguinte:

– A loja manda o produto para que eu coloque na caixa e re-presenteie o chefe

– A loja manda outro produto fechado (outra cor, o vermelho era o último) pelo correio e eu mando a caixa vazia de volta.

Vamos ver o que vai acontecer.
Por enquanto, o recado está dado.
Existe sempre uma maneira melhor, mais correta, mais civilizada, sem arrogância e orgulho, sem empáfia e culpa, para resolver os problemas.

Bom dia.

Update – Acabei de receber a resposta. Eles vão mandar um produto novo, na embalagem, pela DHL. Veio com o texto: ‘você não tem que pagar nada, o erro foi nosso’. Vou mandar a caixinha vazia de volta pelo correio também.

Autor: @rosana

Jornalista, escritora, tricoteira , corredora, agora também em versão maratonista.

19 comentários em “Quando uma empresa age com humanidade e razão”

  1. Na verdade, existe uma atitude ainda pior das empresas: achar que você está tentando enganá-los, dar um “golpe”. Além de passar por uma situação desagradável, você ainda sai ofendido da história.

    Curtir

  2. Oi, Rosana!

    Recentemente aconteceu a mesma coisa comigo e o tratamento que recebi da empresa foi muito semelhante. Estive em NY há alguns meses e comprei uma penca de jogos de videogame em uma loja especializada. Apesar de serem todos para mim, só fui abrir cada um quando cheguei em São Paulo e, para minha decepção, uma das caixinhas também veio vazia. Imaginei que a menina do checkout me entregou a caixa da amostra e não a do estoque. Enviei um e-mail para a central da loja, sem muitas esperanças, apensa comunicando o problema e o que eu achava que havia acontecido. No mesmo dia recebi um e-mail perguntando em qual loja havia sido feita a compra, meu nome completo e detalhes da compra (qual jogos eu tinha comprado). Enviei tudo que foi pedido e no dia seguinte recebi um e-mail do gerente da loja onde comprei, pedindo desculpas pelo ocorrido, que era um pena que eu tivesse tido uma experiência tão ruim com a loja deles, mas que iriam resolver da melhor maneira.

    No fim das contas, uma amiga minha de NY passou na loja, eles entregaram o jogo para ela e MAIS UM de cortesia, junto com U$ 20,00 em dinheiro para que ela me enviasse.

    Indico a loja para todo mundo que vai para lá, sendo que eu poderia fazer exatamente o oposto caso não tivesse sido tão bem atendido depois do problema. É uma pena que, aqui no Brasil, a minha expectativa para problemas como esse é das piores.

    Curtir

  3. muito bacana!

    infelizmente, não tenho exemplos tão bons.

    (segurando pra não falar dos maus exemplos.)

    tenho um, que mostra boa vontade, mas muita atrapalhação: boa vontade “à brasileira”.

    meu pai tem apneia do sono. assisti a uma entrevista no Hoje em Dia, falando sobre um aparelho de abertura nasal apropriado, o Qiar. resolvi comprar para experimentar. entrei no site, fiz o pedido e, antes que o prazo se esgotasse, liguei para saber como andava o processo.

    antes que eu perguntasse qualquer coisa, a atendente já foi me pedindo milhões de desculpas e explicando que por problemas operacionais e limitações do contrato com os Correios a entrega iria atrasar 1 ou 2 dias e tal. entendi e fiquei sossegado.

    1 dia depois do prazo, chegou a caixa do produto, sem nota fiscal.

    liguei para informar a empresa, a fim de que não errassem em outras compras.

    2 dias depois chegou outra caixa do produto, que eu não pedi, de novo sem nota.

    tornei a ligar e informar o ocorrido, disseram para eu ficar com o produto e pediram desculpas pela falta da nota.

    2 dias depois chegaram mais 2 caixas do produto, que eu também não pedi, e sem a nota fiscal.

    agora não vou mais ligar, senão vou acabar com estoque enorme do produto em casa.

    (pior é que meu pai odiou, reclamou que machuca o nariz e é só a gente apagar a luz do quarto para ele tirar o aparelho. ou seja: não vai rolar.)

    já preparei uma carta, pra mandar os produtos que não pedi de volta, explicando o ocorrido. pagarei de bom grado para ajudar a empresa. só não sei se vão entender o recado.

    beijos.

    Curtir

  4. Rosana,
    Se eles enviarem tudo certinho e estiver funcionando direitinho, passa o site pra gente!!hahaha
    Também quero um VideoMemo!!rs

    Curtir

  5. Na verdade, trata-se de uma lei de garantia vigente na Alemanha. Eles nao fizeram nada mais do que cumprir com a lei. Vivo aqui e nao se engane porque na Alemanha, o consumidor nao tem nenhum direito como se tem no brasil. Para qualquer compra, se faz um contrato de 24 meses. No minimo! Por exemplo, que fazer um contrato de celular, minimo de 24 meses. Quer cancelar, minimo de tres meses antes do prazo final do contrato, em alguns casos, tres meses antes do final do primeiro ano de contrato!
    Nem tudo que reluz e ouro!

    Curtir

  6. Será que vou viver o suficiente para ver esse tipo de conduta como regra geral aqui no Brasil? Ainda tenho esperança…

    Curtir

  7. Rosana,
    Sempre que leio um post destes, eu volto a acreditar nas pessoas sejam fisicas ou jurídicas. Ainda há espaço para a sensatez e a honestidade mundo a fora. Certa vez comprei uma máquina digital e um carregador pra minha mãe (presente de dia das mães) no site das Americanas e quando chegou apenas o carregador com o cartão que eu tinha escrito pelo site. Ela me ligou agradecendo o presente, mas não entendia porque eu tinha comprado um carregador novo já que o outro estava funcionando normal. Eu perguntei da máquina a qual ela perguntou: Que máquina? Fiquei arrasado. Minha surpresa tinha ido parar em algum depósito, mas pra mim era como se tivesse ido parar em algum precipício. Eles só me disseram que tinha sido um erro da transportadora. A máquina chegou três dias depois. Mas, o estrago já estava feito.
    Ei, adoro você. Faz tempo que não digo isso.
    Vou confessar um segredo: Tu é uma das minhas 5 melhores amigas, tá?
    Abraçãoooooo
    Fabiano Brilhante

    Curtir

  8. Um tempo atras eu comprei um moletom pela internet, em uma loja americana. Quando o produto chegou, me dei conta que ele era pequeno demais. Mas o erro foi meu, porque o moletom veio no tamanho que eu tinha pedido. Fiz contato com a loja, para ver nao haveria a possibilidade de eu fazer uma troca, enviar o moletom pequeno, e eles me mandavam um num tamanho maior. Resumo: a loja me enviou outro, sem custo nenhum, e disse pra eu ficar com o de tamanho pequeno, pra dar de presente ou pra doar.
    Infelizmente, parece que esse tipo de história só acontece com pessoas jurídicas de fora do pais.

    Curtir

  9. Tive o mesmo atendimento exemplar com a Victoria’s Secret. Comprei pelo site três vezes. Nas duas primeiras vezes chegou tudo sem problemas (na segunda vez chegou até antes do previsto). Nesta última vez a encomenda não chegou após muito tempo da data estimada. Escrevi para a loja e eles imediatamente (em questão de poucos minutos depois do envio do meu email) propuseram enviar tudo novamente ou estornar o valor da compra.

    Tenho uma colega que comprou uma impressora nos EUA. Uns dois dias depois voltou à loja para comprar outra coisa e viu que a mesma impressora havia entrado em promoção, sendo oferecida a preço mais baixo. Ela, brincando com o vendedor, disse que deveria ter esperado mais para comprar. O vendedor chamou o gerente e este propôs imediatamente devolver a diferença a ela, que ficou de boca aberta.

    Temos um Código do Consumidor e outras leias tão boas. Nosso problema é humano mesmo. Ética e bom senso não se impõem em lei.

    Curtir

  10. Por favor, comente quando receber se teve que pagar algum imposto.
    uma vez comprei uma besteira mas que superava 50dolares e paguei quase isso de imposto de importacao. Hoje morro de medo de mandar qualquer coisa pro Brasil…
    ps chato: nao esqueca de contar vale? bjks!

    Curtir

  11. Infelizmente grande parte não age desta forma. Estou há três meses dizendo para a NET que cancelamos o Virtua e que o tecnico deles veio retirar o modem e tenho a Ordem de Serviços em mãos assinada por ele e a NET dizendo que o modem está na minha casa. Pedi um email ou numero de fax para enviar a ordem de serviços e me ignoram dizendo que tem que enviar um técnico, quando tenho que aguardar uma manhã ou uma tarde a espera de um tecnico para verificar que não tenho mais o modem retirado pelo tecnicos deles e que deveriam ter a cópia da ordem de serviços. Prejuizo? Todos os meses estão cobrando o virtua que não tenho desde fevereiro.
    Consumidor/cliente sofre.

    Curtir

  12. Tenho loja virtual, e uma vez o pessoal do estoque enviou um produto vencido que estava separado para ser jogado no lixo. Enviei um e-mail explicando tudo e no mesmo dia enviei o mesmo tipo de produto (com vencimento correto), e ainda paguei o frete express para chegar em menos de 24 horas. Liguei para o cliente para estar atento para a entrega do produto.
    Nao perdí o cliente! 😉

    Já aconteceu do cliente ligar uma semana depois para reclamar que ainda nao recebeu nada. *O pessoal do estoque/deposito falhou! Daí eu enviei o produto + alguns brindes. Mandei e-mail explicando tudo e pedindo para estar atento com o frete (express).
    Mais um cliente conquistado! 😀

    Curtir

  13. Espero q o Brasil chegue a esse nível um dia… Eu comprei um tênis da marca BOOTS (e falo mesmo) q veio mal vedado, mas comprei no verão e só vi a ‘falha’ no inverno, qdo chove entre água pela sola, enviei email dizendo tudo, numero de serie, loja onde comprei, meus dados pessoais, etc
    NUNCA fui contactada de volta!!!

    Curtir

  14. Oi, Rosana! Já tive um problema com uma empresa britânica com filial no Brasil. A filial brasileira cometeu um erro de um produto, que se transformou em um processo de indenização. Não cabia mais recurso a não ser pagar o que devia. Mas o pagamento não acontecia, então, entrei em contato com a matriz em Londres. Mandei um email relatando o problema judicial e o não pagamento. Três dias depois a filial brasileira entrou em contato comigo para pagar o que devia.
    Fiquei admirado com a eficiência e a rapidez da matriz em resolver o problema.

    Curtir

Deixe um comentário